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Problema do Mercosul não é a Venezuela

Aug 21, 2016 by     No Comments    Posted under: Economia, Política

A incorporação da Venezuela ao Mercosul vem sendo uma história de equívocos. A atual polêmica quanto à Presidência rotativa do bloco só ampliou o mal-estar na região. Além de desnecessário, o incidente está desviando a atenção do problema maior do Mercosul, que é a ausência de rumo. Redefinir o bloco é o desafio para os novos governos do Brasil e da Argentina.

A Venezuela não deveria ser membro pleno do Mercosul. Isso está sendo prejudicial ao bloco e seria prejudicial à Venezuela, caso o país adotasse as regras comuns. A adesão foi fruto, à época, de interesses políticos dos governos esquerdistas de Argentina (presidida então por Néstor Kirchner), Brasil (com Lula) e Venezuela (Hugo Chávez).

A Venezuela assinou o protocolo de adesão ao Mercosul em 2006, a convite de Kirchner, sem estudos aprofundados. Em 2009, o Congresso brasileiro aprovou a incorporação. Mas, como o Senado paraguaio não votava, o processo ficou parado até 2012, quando os demais países usaram um subterfúgio. O impeachment expresso do presidente paraguaio Fernando Lugo fez o bloco suspender temporariamente o Paraguai por suposta ruptura democrática (para o quê não havia então previsão legal), permitindo assim a incorporação da Venezuela.

Agora, com as mudanças de governo na região, Paraguai e Brasil se opõem a ter a Venezuela na Presidência rotativo do bloco. O Uruguai é a favor. A Argentina tem ficado em cima do muro.

Todo esse processo foi conduzido de maneira mais política do que técnica. E o resultado foi danoso para todos.

Economicamente, o Mercosul não faz sentido para a Venezuela. Para um país que praticamente só exporta petróleo e derivados e que produz muito pouco do que consome, participar de um bloco protecionista é prejudicial. A Venezuela não tem indústria para proteger, como têm Brasil e Argentina. E não se beneficia do mercado desses países, como ocorre com Uruguai e Paraguai. Para a Venezuela, faz sentido importar pelo menor preço possível os produtos do que necessita, inclusive bens que possam fomentar setores não petroleiros da economia. Nenhum outro país que exporta basicamente uma só commodity faz parte de um bloco comercial tão restritivo como o Mercosul.

Há outro problema. O maior financiador da Venezuela hoje é a China. Mas o crédito chinês costuma vir vinculado à compra do produtos e serviços chineses. Se adotasse a tarifa externa comum (TEC) do Mercosul, a Venezuela teria de taxar esses produtos, o que os chineses certamente não querem.

E provável que a própria Venezuela peça para sair do Mercosul, quando houver uma troca de governo no país.

Para o Mercosul, a presença da Venezuela também tem sido um fardo. Agravou tensões internas, gerou desconfiança externa (o resto do mundo passou a ver o bloco como mais instável e menos propenso a abertura comercial) e piorou a sua já frágil estrutura institucional.

Nem comercialmente a adesão gerou os benefícios esperados. As exportações brasileiras para a Venezuela já vinham crescendo antes da adesão venezuelana, puxadas pela alta do petróleo. E vem caindo desde a entrada formal do país no Mercosul, coincidindo com a queda do petróleo. Neste ano, essas exportações devem recuar ao nível de 2004.

A criação ou ampliação de uma área comercial nunca é apenas uma questão econômica. Sempre há interesses políticos. Foi assim com a incorporação dos países ex-comunistas do Leste Europeu pela União Europeia. Mas a EU impôs um conjunto de condições que os países tiveram de cumprir antes de entrar formalmente no bloco.

Como as regras do Mercosul são muito prejudiciais à economia da Venezuela, era previsível que o país nunca iria dotá-las. Foi o que ocorreu.

Agora, também por questões políticas, o governo brasileiro não quer que a Venezuela assuma a Presidência rotativa do bloco, um cargo de coordenação que Caracas já ocupou em 2013. Por trás disso estão as duras críticas de Venezuela ao impeachment contra a presidente afastada Dilma Rousseff, o que fez o governo brasileiro reagir.

Essa polémica é irrelevante. Imersa numa forte crise política e econômica, a Venezuela não tem capacidade de gestão e não poderia causar nenhum dano ocupando a Presidência do Mercosul. Do mesmo modo, não faz sentido um bloco comercial ser liderado por um país que busca instaurar o socialismo por meio de estatizações.

Mas, mais do que irrelevante, a polêmica é diversionista. O problema básico do Mercosul não é a Venezuela, mas sim, que Brasil e Argentina não definem que estratégia comercial querem perseguir – o que negociar, com quem e em quis termos.

Com novos governos, os dois países têm uma oportunidade agora para rediscutir os impasses e buscar um entendimento. Mas ainda não há sinais disso. A Argentina continua recusando uma mudança na regra que impede os países do loco de negociar outros acordos comerciais individualmente.

Desde o governo FHC, passando por Lula e Dilma, as autoridades dos dois países repetem uma retórica vazia de consolidação do bloco e então expansão para a América do Sul. Ninguém mais acredita que isso vá acontecer, pois Chile, Peru e Colômbia já aderiram à esfera comercial dos EUA.

É vital superar logo a polêmica sobre Venezuela e focar no que importa: pensar coisas novas.

Fonte: www.valoronline.com.br

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